quarta-feira, 25 de março de 2015

Encontrei o que não procurava

As pernas são curtas
Para tanta loucura na cabeça
Posso correr o mundo
Num único abraço
Posso revolucionar tudo
Quando giro a minha cintura
Junto a tua

A gente só acha
Quando não procura
Praticamente tropeça
No que não via
E agora está tão na cara
Não percebia
Porque procurava
Só achei
Porque parei de procurar

Angústia

Dentes apertados
Olhos semicerrados
Sob o semblante que pesa
Acima da face crispada
O rosto emoldurado
Da amargura
A garganta arranha
A boca seca
Amarga
Com a fumaça
Do cigarro barato
Desce um trago de cachaça
Rasgando ao meio
A alma
Mata o mal
Junto com o espírito
Dói o estômago
E o fígado
Sintetizando a angústia
Com álcool
Coquetel fatal
Frêmito
Espasmo
Suor frio
O corpo sofre
A doença da mente
Já foi meia garrafa
Vou até o fundo
Desse poço
A torneira pinga
Sobre a louça suja
A banalidade do dia-a-dia
O nó começa na tripa
E termina no peito
Vazio
Oprimindo a respiração
A cabeça ecoa
Um único pensamento
Estado de obsessão
Dedos rijos
Pernas irrequietas
Mas lânguidas
Batucada nervosa
Pra fingir mansidão
Não tenho controle
A janela aberta
Para o abismo iluminado
Da furna urbana
O que é um grito
Contra o alarde
De toda a cidade?

Cotidiano

A fachada iluminada
Pouco ilumina a alma
De quem passa pela calçada
Indo e vindo
Ou vindo e indo?
Preciso pensar
Preciso parar de pensar
A garganta apertada
Seca
Pede um trago
Meu templo é o bar
Parada pra rezar
Desce uma cachaça
Não queima
Leva a enxurrada
Pra dentro
A brasa estanca
O sangramento
De novo à rotina
Amortecido
Onde estava mesmo?
A caminho do trabalho
Ou voltando pra casa?
Preciso me lembrar
Preciso parar de lembrar
Desse avesso
Em tumulto
Em revolteio
Chocando-se contra o esqueleto
Virado
Todo dia logo cedo
Mal dormido
Mal alimentado
Mas aprumado
Com desodorante disfarço
O cheiro de medo
Caminho reto
Rumo certo
Acho que vejo tudo
Mas estou cego
Quero conquistar o mundo
Mas nem a fila do ônibus consigo
Nunca sou o primeiro
Meu cotovelo é demasiado curto
Pra abrir caminho
Nesse destino estreito
Doutor, tenho documento
E endereço
Nesse cotidiano
Não me perco

Apenas me esqueço
Porque tenho esse eterno vezo
De esconder o que sinto
E penso
De mim mesmo
De me afogar a noite
Pra nadar pela manhã
De ir dormir só hoje
Pra não gastar a companhia de amanhã
De ser infeliz agora
Esperando pra ver no que dá

Sobre ser homem

Meu pai jamais me disse
Um eu te amo
Se bem me lembro
Apenas uma única vez
Ele estava bêbado
Momento de fraqueza talvez
Quiçá meu pai pensasse
Que isso faria de mim
Viado, bicha
Ele dizia
Meu pai não me ensinou muita coisa
Mas se concentrou em criar
Um homem
Tal como seu pai havia feito dele um
Homem não chora
Homem bebe
Homem manda
Não obedece
Foi o que ele me deixou de ensinamento
Hoje conseguimos dizer um ao outro
Essa palavra tão embaraçosa
Meio sem jeito, é verdade
Tentamos transmitir esse sentimento
Inconfessável entre dois homens
E ainda – veja só você!
Conseguimos até dar beijo
Pelo telefone
Com a segurança psicológica
Que só a distância física dá

Meus amigos
Não costumavam se abraçar
O certo era só pegar na mão
Munheca firme
Conhece-se o caráter de um homem
Pelo aperto de mão
Coisa que meu pai havia me dito já
Se tivesse abraço
Tinha de vir acompanhado
De um palavrão
“E aí arrombado”
Pra não deixar no ar
De que se tratava
De abraço de macho
Hoje em dia tem abraço
Tem beijo na bochecha
E o bom e velho
Tapinha nas costas
Só não tem colo
Isso não
Demonstrações de carinho
Ainda têm limites
Mas convenhamos
É uma grande evolução

sexta-feira, 13 de março de 2015

Final de semana

Hoje é sexta
Tem pra quem
A semana acaba
Pausa no trabalho
Amanhã é sábado
Olha aí a balada
Até podia
Jurar que me divertia
Som alto
Risada
Festa no carro
Deitei na cama
Nem lembro como
Dormi calçado
Domingo na ressaca
Tristeza solitária
Serotonina em baixa
A realidade nua e crua
Ameaça
Domingo dá medo
Eu comigo mesmo
Já penso em problema
Vem logo segunda
Apartamento pequeno
Alugado
Ecoa o eco
Da minha cabeça
Na alma aperto
Na geladeira
Comida congelada
Um baseado
Tevê a cabo
A pia sempre cheia
De louça suja
Empilhada
Desta semana
Ou da passada?
Começa outra
Até a próxima sexta
Eu lavo