quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Histórias de um futuro próximo

Lembro-me bem quando, ainda criança, ouvia e via pela televisão apelos para que puséssemos fim ao aquecimento global. Faziam conjecturas sombrias sobre um futuro particularmente sem saídas, beco no qual a humanidade estaria condenada. Mas eram somente conjecturas, diziam, isto é, baseados no modo que produzimos e vivemos, ou mudamos radicalmente nossa relação com o mundo, ou perecer-nos-emos. Parece que falhamos fragorosamente.


Suas antevisões de certa maneira se concretizaram. Estamos hoje reduzidos a cacos do que fomos um dia, vivendo dos restos materiais de uma sociedade outrora vencedora. Espalhados, esgueirando como ratos, os homens perderam sua posição privilegiada no planeta. Como afinal essa catástrofe foi acontecer?


Contudo, aquelas vaticinações terríveis do passado viam na causa um mero efeito, e culparam sujeitos inocentes pelo apocalipse. Cobravam atitudes corriqueiras e triviais de homens igualmente banais, o que, segundo diziam, seria suficiente para evitar o pior. “Faça sua parte”, era a frase de ordem mais utilizada. Mas o que poderiam fazer aqueles homens, pobres coitados que mal tinham o mínimo de condições materiais para se sustentarem decentemente, diante da iminência do problema? Absolutamente nada. Metade dos seres humanos daquela época vivia com menos de dois dólares por dia. Vocês crianças certamente não sabem o quão pouco isso significava, porém, acreditem em mim, era pouco, bem pouco. O que deveriam fazer, parar de respirar e morrer?


Enquanto isso, homens privilegiados e reduzidos numericamente, cujos bens utilizavam para explorar aqueles, gastavam os recursos do mundo insaciavelmente. Seus carros, enormes e elegantes, com motores turbo lançavam ao ar mais CO2 por dia do que qualquer operário produziria em toda sua vida. Suas fábricas, ligadas vinte e quatro horas, fabricavam milhões e milhões de mercadorias descartáveis a cada minuto, consumindo matéria natural, cada vez mais e mais, mercadorias que não satisfaziam aos interesses humanos, mas sim à necessidade insidiosa de um ser chamado de capital, o qual acumulava e acumulava, até implodir, como vocês bem sabem. Queimaram as florestas tropicais, caçaram as baleias até a extinção, poluíram rios e mares com lixo não-biodegradável, plantaram bilhões de hectares com culturas nocivas ao equilíbrio ambiental, fizeram isso e aquilo, “pintaram e bordaram”, como dizia minha finada avó. Vocês vêem o resultado. Podem apreciar o que lhes deixaram de herança?


De qualquer maneira crianças, a história de hoje teve apenas uma intenção: fazer justiça aos seus pais, trabalhadores insuspeitos que foram devorados por uma lógica estranha ao ser humano, uma lógica que criaram, embora jamais imaginassem a onde levariam seus descaminhos.